Ora-pro-nobis é um bom alimento, mas não é fonte de proteínas

 Luiz Fernando Miranda e Karla Silva Ferreira


Os alimentos ricos em proteína estão cada vez mais valorizados por
serem determinantes para o crescimento dos músculos e causar saciedade. A
fama dos alimentos proteicos se elevou, sobretudo após as publicações de
novas pesquisas associando o aumento dos músculos com maior expectativa de
vida, prevenção e tratamento de doenças. Um estudo publicado em 2022 pela
British Journal of Sport Medicine mostrou que exercícios físicos de musculação,
associado a dieta balanceada, reduziram o risco de mortalidade por todas as
causas, principalmente por doenças crônicas não transmissíveis, como doenças
cardiovasculares, câncer e diabetes.


Os principais alimentos proteicos de origem animal são o leite e seus
derivados, ovos e carnes e, dentre os vegetais, são a soja, a ervilha, o grão de
bico, os feijões, a lentilha e o tremoço. Contudo, um alimento vegetal que vem
ganhando o noticiário brasileiro, com a fama de ser muito rico em proteínas,
vitaminas e minerais, também chamada de “carne verde”, é a ora-pro-nobis
(nome científico Pereskia aculeata ou Pereskia grandifolia). Esta notícia foi de
grande agrado aos vegetarianos, que no Brasil já perfaz em torno de 14% da
população. Mas, será que esta planta é tão nutritiva quanto dizem?


Na tabela abaixo são mostrados o valor energético e as quantidades de alguns
nutrientes em 100 g da planta ora-pro-nobis crua (folhas e talos).
Tabela 1. Valor energético e teores de nutrientes em 100 g de ora-pro-nobis crua,
Pereskia aculeata (folhas e talos)


Com base na Instrução Normativa no 75/2020 da Agência Nacional de Vigilância
Sanitária, poderíamos considerar que se uma empresa embalasse e vendesse
a ora-pro-nobis, o fabricante poderia alegar que ela é apenas fonte de fibra
alimentar e vitamina A. A fibra é importante para a boa saúde do trato
gastrointestinal e imunidade e a vitamina A é essencial para a visão, regeneração
de mucosas e outras funções. Contudo, este fabricante não poderia alegar que
esta hortaliça é fonte de proteína e nem dos demais nutrientes, pois para isso
deveria conter, no mínimo, 10% da recomendação diária de proteínas, ou seja,
pelo menos 5 g na porção e, no caso de vitaminas e minerais, no mínimo 15%
de cada um destes nutrientes.
Na tabela abaixo pode-se comparar o teor de nutrientes e energia da ora-
pro-nobis com a couve e a rúcula, também hortaliças folhosas.


Repare na tabela 2 que nenhuma das folhas é fonte de proteína e que a couve,
hortaliça tão comum na dieta do brasileiro, contém teor proteína um pouco maior
do que a ora-pro-nobis. Portanto a atribuição à ora-pro-nobis de ser um alimento
rico em proteína é mais uma questão de modismo do que de ciência. Quanto aos
demais nutrientes, especialmente vitaminas e minerais, observa-se que há
tendência dos teores serem semelhantes entre as três hortaliças. Entretanto, é
importante ressaltar que há variação na composição dos alimentos devido a
fatores como local de cultivo, variedade, grau de maturação, tempo de
estocagem, dentre outros. Além disso, não se pode desconsiderar a
possibilidade de haver erros analíticos ou de digitação na apresentação dos
resultados das análises. Por este motivo, ao se referir ao valor nutritivo de um
alimento é importante ter como referência a natureza do mesmo. Por isso
fizemos a comparação destes três alimentos folhosos.

Dificilmente haverá nas folhas das hortaliças alto teor de proteína ou
lipídio ou carboidrato, justamente pelo papel que a folha exerce na planta, que é
a fotossíntese e não armazenamento de nutrientes como as sementes, frutos e
alguns caules e raizes. Além disso, as folhas são muito ricas em água (em torno
de 90%) e em fibras, e assim, a soma dos teores de proteínas, carbodraros,
lipídios, minerais, vitaminas e outros compostos, não ultrapassariam 10 g em
100 g (10%). Quando um alto valor nutritivo é atribuído a uma folha é porque se
está referindo a folha desidratada, ou seja, a matéria seca ou o produto seco.




REFERÊNCIA

1. Momma H, Kawakami R, Honda T, et al Muscle-strengthening activities
are associated with lower risk and mortality in major non-communicable
diseases: a systematic review and meta-analysis of cohort studies British
Journal of Sports Medicine 2022; 56:755-763.

2. Sociedade Vegetariana Brasileira. Pesquisa do IBOPE aponta
crescimento histórico no número de vegetarianos no Brasil, 2018.
Disponível em <Pesquisa do IBOPE aponta crescimento histórico no
número de vegetarianos no Brasil>. Acessado em 05 de outubro de 2022.

3. Maciel VBV, Yoshida CMP, Goycoolea FM. Agronomic Cultivation,
Chemical Composition, Functional Activities and Applications of Pereskia
Species - A Mini Review. Curr Med Chem. 2019;26(24):4573-4584.

4. Pinheiro, Paula Oliveira et al., Composição Centesimal De Folhas De Ora-
Pro-Nóbis (Pereskia Aculeata Miller) Cultivadas Em Cuiabá-Mt. In: Anais
Do 14 Slaca - Simpósio Latino-Americano De Ciência De Alimentos, 2021,
Campinas. Anais eletrônicos... Campinas, Galoá, 2021. Disponível em:
<https://proceedings.science/slaca/slaca-2021/papers/composicao
centesimal-de-folhas-de-ora-pro-nobis--pereskia-aculeata-miller--
cultivadas-em-cuiaba-mt?lang=pt-br>. Acesso em: 05 out. 2022

5. Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (TBCA). Universidade de
São Paulo (USP). Food Research Center (FoRC). Versão 7.2. São Paulo,
2022. [Acesso em: 5 de outubro de 2022]. Disponível
em: http://www.fcf.usp.br/tbca.

6. Abobe stock. Pereskia. Disponível em <Pereskia Images Browse 265
Stock Photos, Vectors, and Video | Adobe Stock>. Data de acesso: 05 de
outubro de 2022.

7. Brasil 2018. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância
Sanitária. Instrução Normativa nº 28, de 26 de julho de 2018. Diário Oficial
[da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 27 jul. 2018

8. Instituto Brasileiro de Estatística - IBGE. Estudo Nacional de Despesa
familiar. Tabela de Composição de Alimentos. 5ª edição. 1999. 127p.


Comentários

Postagens