Obesidade e sobrepeso: existe diferença no tratamento nutricional para perda de peso?

 Luiz Fernando Miranda e Karla Silva Ferreira


A obesidade é uma doença crônica não transmissível caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal uma vez que houve mais obtenção de energia por meio da ingestão de alimentos do que a capacidade do corpo em gastá-la. Esta quantidade de gordura está correlacionada com índice de massa corporal (IMC) igual ou acima de 30 Kg/m2 para adultos. O IMC é obtido pela divisão da massa corporal (Kg) pelo valor da estatura (m) elevado ao quadrado. Exemplo: estatura de 1,63 metro e massa de 80 quilos, logo 80/ (1,63)2 = IMC de 30,1 Kg/m2 . Na Figura 1 é mostrada a classificação do estado físico corporal com base no IMC e na Figura 2 um esquema com exemplos práticos de aplicação da classificação da obesidade. Atualmente também existe classificação de IMC acima de quarenta. Pessoas com IMC acima de 50 Kg/m2 são consideradas com super obesidade e com IMC igual ou acima de 60 Kg/m2 são consideradas com super-superobesidade.




Há situações especiais de pessoas que possuem IMC igual ou acima de 30 mas que não são obesas, por exemplo indivíduos musculosos. Em casos de incerteza é importante que o profissional de saúde realize exames complemenares para certificar se o teor de gordura corporal está realmente elevado (ex. medidas de pregas cutâneas e de circunferências, bioimpedência e densiometria de composição corporal). Quando pessoas do sexo feminino apresentam circunferência abdominal acima ou igual a 80 cm e pessoas do sexo masculino acima ou igual a 90 cm, as mesmas, provavelmente, possuem risco mais elevado de co-morbidades (doenças cardiovasculares, por exemplo). 

O aumento anormal da gordura no corpo gera um processo inflamatório crônico que pode levar à disfunção de diversos tecidos, aumentando assim os riscos para outras doenças. Já se estima que há em torno de 200 doenças associadas à obesidade, sendo as mais comuns o diabetes, doenças autoimunes, doenças cardiovasculares, do coração, desordens musculoesqueléticas, doenças neurodegenerativas, coronarianas, cânceres de próstata, de útero, de fígado, de cólon, de rins e de vesícula biliar.

Quando um paciente procura emagrecer, mas ele não tem obesidade e a principal queixa é a insatisfação com a estética corporal e sem possíveis problemas psiquiátricos, psicológicos e/ou hormonais, a intervenção pode ter duração de dias ou meses, mas sem necessidade de condutas especiais. No entanto, quando há diagnóstico de obesidade há grande chance deste paciente apresentar desequilíbrio na produção de hormônios relacionados ao apetite, que controlam a tireoide, que controlam a saciação e saciedade e que aumentam a fome hedônica (quando o paciente busca sempre por alimentos muito palatáveis, ricos em gordura, sal e carboidrato, sobretudo os açúcares). Na fome hedônica o ato de comer é recorrente sem que haja fome fisiológica ou fraqueza por falta de energia. Neste caso o consumo destes alimentos eleva a produção de dopamina e serotonina que provocam sensação de prazer e bem-estar. Isto pode gerar compulsão, transtornos de autoimagem e até bulimia. Na bulimia o paciente se sente culpado e provoca vômito recorrentemente após comer os alimentos que ele julga “engordativos”. O ato de comer em excesso está normalmente associado ao estresse excessivo e por isso o acompanhamento psicológico é fundamental. Todos estes fatores dificultam o processo de emagrecimento pelo paciente obeso. Em razão de vários destes fatores estarem ausentes ou menos intensos na vida das pessoas que não tem obesidade, estas emagrecem com menos dificuldade e em menor tempo. Desta forma, é fundamental que haja diferenciação na condução de emagrecimento pelo paciente com obesidade e pelo paciente sem obesidade. E para haver discernimento no tratamento é importante que o profissional tenha conhecimento e habilidade específica para tratar este grupo especial. 

Para o tratamento e controle do excesso de gordura corporal, a Organização Mundial da Saúde recomenda adequação da dieta, uso de medicamentos, exercício físico regular e acompanhamento psicológico e talvez, psiquiátrico. Nas redes sociais muitos programas de emagrecimento são vendidos com a promessa de cura da obesidade, bem como dietas de desafios de 15 dias, ou ainda fórmulas fitoterápicas para emagrecimento rápido (muitas delas contêm inibidores de apetite na formulação sem que sejam declarados nas embalagens). Além disso, existem diversas dietas da moda com baixa aderência a médio e longo prazo, que requerem muitas horas de jejum, pobres nutricionalmente, causadoras de fraqueza, perda de músculo, perda óssea, anemia, cefaléia, deixando assim a pessoa ainda mais estressada e ansiosa. Agora cabe uma pergunta importante: se não existe dieta para cura do diabetes ou programa de desafio de 15 dias para acabar com a hipertensão, por que razão teríamos dietas de 15 dias para acabar com a obesidade, sendo que esta também é uma doença crônica e sem cura? É fundamental que população reflita sobre isto, pois além de causar dano à saúde e traumas, muitas vezes leva o indivíduo a abandonar o tratamento e voltar a ganhar peso. 

Ainda assim, mesmo que o tratamento convencional seja aplicado, há casos de insucesso. Há pessoas com obesidade grau III e com doenças descompensadas que não se adaptaram a medicação e dieta. Nestes casos pode haver indicação para cirurgia bariátrica. A maioria dos pacientes bariátricos têm sucesso no emagrecimento, porém alguns cursam com reganho de peso por não cumprirem as recomendações essenciais: educação nutricional e prática de exercício físico regular para toda a vida. 

 Diante do sedentarismo, do elevado consumo de alimentos ultraprocessados ricos em energia e em sal, com pouca variedade de nutrientes, altamente palatáveis e fáceis de serem comprados e consumidos, o índice de pessoas com sobrepeso e obesidade têm crescido assustadoramente. Estimase que em 2030, quase 70% da população brasileira esteja acima do peso e 33% esteja obesa. Se você tem sobrepeso, procure emagrecer para que não tenha obesidade futuramente. Mas, se você tem obesidade saiba que precisará de acolhimento especializado e que o excesso de peso não é falta de vergonha, não é desleixo, não é sua culpa, mas é da sua responsabilidade se tratar. Fazendo o tratamento correto o sucesso é promissor

REFERÊNCIAS

Wilkinson, K.H., Helm, M., Lak, K. et al. O Risco de Complicações PósOperatórias em Super-Super Obesidade em comparação com a Super Obesidade em Centros de Cirurgia Bariátrica Credenciados. OBESIDADE SURG. 29 (2964-2971), 2019.

WHO. Obesity and overweight. Disponível em: . Data de acesso: 3 de setembro de 2022

ABESO. Vamos falar sobre obesidade? - Abeso. Disponível em: https://abeso.org.br/vamos-falar-sobre-obesidade/. Data de acesso: 4 de setembro de 2022 


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