Proteínas -qualidade e fontes dietéticas - Artigos Projeto de Extensão



Proteínas - qualidade fontes dietéticas
Luiz Fernando Miranda e Karla Silva Ferreira

As proteínas têm função estrutural e reguladora nos animais, pois formam os músculos, unhas, cabelos, tendões, vasos sanguíneos, enzimas, anticorpos, membranas das células, hormônios, transporte de substâncias no sangue, armazenamento de minerais etc. A despeito de todas estas funções, os animais não armazenam proteínas! Os indivíduos que desejam ganhar massa muscular acreditam que o consumo elevado de proteínas irá ajudá-los neste sentido, mas não é exatamente assim que acontece no organismo.

O objetivo deste texto é contribuir para o entendimento sobre proteínas: suas definições, qualidade e boas fontes dietéticas.

As proteínas são polímeros formados por aminoácidos. Em sentido figurado, polímeros são como cordões e os aminoácidos, as pedras ou missangas que formam estes cordões. De modo geral, as proteínas são formadas por sequências de mais de 20 aminoácidos, podendo chegar até a mais de 4500 aminoácidos em sequência. Uma das menores proteínas é a insulina, formada por duas cadeias de aminoácidos: uma com 21 aminoácidos e outra com  30  aminoácidos. Apesar de existirem mais de trezentos tipos de  aminoácidos,  apenas    20     são encontrados frequentemente nas proteínas que formam os seres vivos.

Destes 20 aminoácidos, 11 os seres humanos sintetizam a partir dos carboidratos e 9 os seres humanos não sintetizam.  Os aminoácidos que o ser humano não sintetiza são denominados essenciais e devem ser fornecidos pela alimentação. Alguns poucos aminoácidos, além destes 20, podem ser encontrados em algumas proteínas específicas. Estes aminoácidos são formados a partir de modificações em algum dos 20 aminoácidos após eles terem sido incorporados na sequência da proteína. Os aminoácidos hidroxilisina e hidroxiprolina, presentes em grande quantidade no colágeno, são exemplos destes tipos de aminoácidos formados após os aminoácidos originais, lisina ou prolina, terem sido incorporados na sequência de aminoácidos durante a síntese da proteína específica. 

Na Figura 1, são mostradas as estruturas dos 11 aminoácidos não essenciais e, na Figura 2, a estrutura dos aminoácidos essenciais. 

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Quando se diz que uma proteína é de boa qualidade ela deve atender a dois quesitos: 1) deve possuir todos os aminoácidos essenciais em quantidades que sejam proporcionais às nossas necessidades; 2) deve ser digerível, o que significa que o organismo será capaz de hidrolisá-la e liberar a maior parte ou todos os aminoácidos para que possam ser absorvidos e utilizados pelo corpo. A Figura 3 ilustra uma sequência de aminoácidos de uma proteína de boa qualidade nutricional— a caseína — e uma proteína de baixo valor nutritivo — o colágeno. A caseína é composta por maior diversidade de aminoácidos e elevado teor de lisina, fenilalanina e isoleucina, aminoácidos essenciais. No colágeno, de cada três aminoácidos, um é glicina. Os outros aminoácidos predominantes são a hidroxiprolina e hidroxilisina, que não podem ser aproveitadas pelo organismo como tal, pois não são incorporados nas proteínas já prontos. Eles são derivados dos aminoácidos prolina e lisina, respectivamente, após a colocação de uma hidroxila. Entretanto, esta hidroxilação ocorre apenas quando os aminoácidos precursores já foram incorporados a outros aminoácidos formando um polímero.

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Os animais somente absorvem os aminoácidos isoladamente. Pedaços de proteínas, ainda que pequenos, não são absorvidos em condições normais. Quando fragmentos de proteínas atravessam a membrana do intestino, significa que há algum problema. A Figura 4 ilustra o percurso de uma proteína no organismo. Inicialmente, o alimento deve ser mastigado —  isto é, quebrado e/ou triturado — e misturado com a saliva para facilitar sua deglutição e início do processo de digestão. Ao chegar no estômago, o alimento é misturado com o suco gástrico contendo ácido clorídrico, que intensifica o processo de desmanchar o alimento para que as ligações entre os aminoácidos das proteínas sejam expostas e as enzimas possam atuar nestas    ligações      liberando       pedaços menores.  Do estômago, o   alimento   vai para o intestino delgado, onde é colocado em contato com as enzimas que podem liberar cada aminoácido para absorção. Os pedaços de proteínas que não puderam ser totalmente hidrolisadas no intestino delgado seguem para o intestino grosso, onde podem ser aproveitados por microrganismos ou eliminados integralmente nas fezes. No intestino grosso, há grande diversidade de microrganismos, tanto benéficos quanto prejudiciais para a saúde. O excesso de ingestão de proteínas favorece a proliferação de microrganismos putrefativos, que utilizam estas sobras de proteínas, mas liberam gases fétidos e amônia, que é prejudicial para o intestino.

Os tecidos dos animais possuem, predominantemente, água, gordura e proteína. Outros componentes estão em menor quantidade, como carboidratos, minerais e vitaminas. Dos nutrientes acima, os animais armazenam apenas as gorduras “ilimitadamente” (até que a quantidade seja incompatível com a vida) e alguns compostos solúveis em gordura. Os aminoácidos das proteínas, após serem absorvidos, passam pelo fígado e daí para o sangue, de onde são distribuídos para todo o corpo. O excedente é recaptado pelo fígado e transformado em gordura ou glicose e ureia. Quando há necessidade imediata de energia, a prioridade é a formação de glicose. Quando o nível de glicose no sangue está normal ou elevado, os aminoácidos são transformados em ácidos graxos e armazenados no tecido adiposo como triacilgliceróis. Tanto os triacilgliceróis quanto a glicose não possuem nitrogênio em sua estrutura, portanto, há necessidade de eliminar os nitrogênios dos aminoácidos. A maioria dos animais terrestres, inclusive nós humanos, excreta os nitrogênios excedentes na forma de ureia. Quanto maior a ingestão desnecessária de proteínas, maior o teor de ureia na urina.   A ureia é formada com dois átomos de nitrogênio dos aminoácidos e átomos de carbono do CO2 proveniente do metabolismo de carboidratos ou gorduras. A excreção de ureia considerada normal é de 10 a 50 mg/dL de urina. Quando os aminoácidos dos músculos são utilizados para produção de energia, seus nitrogênios são transportados para o fígado para serem também transformados em ureia e posteriormente eliminados, pois apenas o fígado é capaz de formar ureia. A Figura 5 ilustra os possíveis destinos dos aminoácidos das proteínas no organismo. 

 
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Quando o organismo está necessitando sintetizar alguma proteína, é preciso que todos os aminoácidos estejam disponíveis     no      momento,    tanto     os essenciais quanto os não essenciais. Conforme descrito anteriormente,   não essenciais quanto os não essenciais. Conforme descrito anteriormente, não há possibilidade de as células estocarem            grande  quantidade de aminoácidos    (para  serem   utilizados  sabe-se       quando !!!).   

Sendo      assim, diante da necessidade imediata de certos aminoácidos, o organismo lança mão dos aminoácidos dos músculos e posteriormente os repõe, tanto por meio da alimentação quanto sintetizando os não essenciais.  A Figura 6 ilustra a formação das proteínas do organismo utilizando tanto aminoácidos essenciais quanto não essenciais.

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As pesquisas relacionadas à qualidade das proteínas (digestibilidade e perfil de aminoácidos) e quantidades requeridas pelos animais tiveram grande avanço a partir de 1960. As proteínas de melhor qualidade presentes em nossos alimentos são as albuminas, a caseína e algumas das proteínas musculares. As albuminas são encontradas, principalmente, na clara do ovo, soja e grão de bico, mas também, em menor quantidade, em outros alimentos de origem vegetal.  A caseína é específica do leite e seus derivados (iogurtes, queijo, coalhada etc).   Dentre as proteínas musculares de elevado valor nutricional, estão a actina e a miosina. O colágeno é uma proteína exclusiva do reino animal e muito abundante nos músculos e outros tecidos animais, porém, conforme já relatado anteriormente, é de péssima qualidade nutricional.

No Quadro 1, estão relacionadas algumas proteínas e suas composições em aminoácidos.  Observe que as proteínas do arroz possuem teores elevados de aminoácidos sulfurados (cisteína e metionina) mas baixos teores de lisina. Já o feijão possui limitação quanto aos aminoácidos sulfurados mas possui teores elevados de lisina. Por este motivo, a dupla “arroz com feijão” é tão famosa. Eles se completam em termos de balanceamento de aminoácidos essenciais quando na proporção de três partes de arroz para uma parte de feijão.


Quadro 1: Composição em aminoácidos de alguns alimentos

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Os músculos dos animais, de todas as espécies, são muito semelhantes. Na verdade, são praticamente iguais! O mecanismo da contração muscular é dado pela interação das proteínas actina e miosina auxiliado por outras proteínas presentes em menor quantidade.  Estes aparatos especializados para a contração muscular são agrupados em feixes  que ficam envoltos pelo colágeno. A principal diferença entre as carnes das diversas espécies e raças de animais é a capacidade de armazenar oxigênio. Quanto maior a capacidade de armazenar oxigênio, maior o teor de mioglobina nos músculos. Consequentemente, maior    o    teor    de ferro. As carnes de aves, por exemplo, são mais claras e mais pobres em ferro que as carnes de boi e de caças, que são mais escuras e mais ricas em ferro. Os animais mais velhos e os submetidos a maior intensidade de atividade física possuem também maior teor de colágeno em suas carnes, que são mais duras. As carnes mais vermelhas podem possuir maior quantidade de gordura, visto que o metabolismo das gorduras é essencialmente aeróbico. 

A quantidade de proteína que um adulto precisa ingerir diariamente é bem pequena em relação às quantidades de água e carboidrato. Os diversos estudos realizados  em  todo  o  mundo levaram a Organização Mundial de Saúde a recomendar a ingestão de 0,80g/kg de peso/dia considerando uma proteína de média qualidade nutricional. Na prática nutricional, o mais usual é entre

1,4 a 2 g gramas de proteína por kg de peso corporal por dia. Quantidades superiores, de no máximo até 3g/kg de peso/dia, somente são recomendadas para atletas de atividades físicas vigorosas.

No Quadro 2 são mostradas algumas importantes fontes dietéticas de proteínas. Observe que as carnes não possuem carboidratos e os vegetais pouca quantidade de gordura.

Quadro 2 -   Teores de água, proteínas, carboidratos e gorduras (%) e valor energético (kcal) em 100 gramas de alguns alimentos.

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Os suplementos nutricionais proteicos mais comuns são fabricados a partir de proteínas da soja, do soro de leite ou da clara de ovo. Os suplementos à base de clara de ovo são constituídos, praticamente, pela albumina. O whey protein é obtido do soro do leite, que é um produto rico em albumina, portanto também de excelente qualidade nutricional. Normalmente, o whey protein contém 90% de proteína e 10% de carboidrato, dentre os quais a lactose. Por este motivo não é indicado para pessoas com intolerância à lactose.  Os suplementos provenientes da soja possuem proteína de boa qualidade nutricional, uma vez que a soja possui altos teores de albumina, e são isentos de lactose.

A alegação, em alguns suplementos proteicos, da presença de aminoácidos de cadeia ramificada é devido à presença dos aminoácidos valina, leucina e isoleucina, presentes em quantidade elevada nas proteínas musculares. Conforme foi mostrado anteriormente, estes aminoácidos são encontrados em todas as boas fontes de proteínas.

Uma consideração importante sobre o consumo de proteínas e formação de massa muscular é a constatação de que trabalhadores braçais e indígenas possuem corpo atlético e com músculos bem desenvolvidos, tendo uma alimentação essencialmente à base de carboidratos. Por outro lado, nos esquimós, cuja alimentação é à base de proteínas, tem sido encontrado elevado índice de obesidade. A formação de massa muscular é uma combinação de nutrição adequada, atividade física condizente e potencial genético.


Referências Bibliográficas

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