AFINAL, COMER OU NÃO ALIMENTOS COM GLÚTEN? Artigos Publicados Nossos Alimentos
Afinal, comer ou não alimentos com glúten?
Luiz Fernando Miranda da Silva e Karla Silva Ferreira
Aquele indivíduo com diarreia aguda acompanhada de dor e desconforto abdominal após comer alimentos contendo centeio, trigo ou cevada, pode apresentar reação autoimune ao glúten, denominada doença celíaca, ou terem a síndrome Não Celíaco Sensível ao Glúten (NCGS), transtorno proposto em 2012 na Alemanha, na Segunda Reunião entre Especialistas em Sensibilidade ao Glúten.
Embora não se tenha estimativa concisa sobre o número de habitantes NCGS, acredita-se que seja maior do que os acometidos pela doença celíaca (1%). Nos EUA, a doença celíaca afeta 1,13% da população e, no Brasil, dependendo da região, afeta entre 0,5% e 1,9% da população . Pessoas com pais ou avós doentes celíacos possuem maior chance de ter a doença, sem que necessariamente, apresente sintomas de sensibilidade .
O glúten está presente em quase todos os alimentos derivados de grãos de trigo, aveia, centeio e cevada, como pão, massas, biscoitos, bolos e torradas. O grão do trigo, assim como os demais cereais citados, contém no endosperma (tecido de reserva de nutrientes) o complexo de proteína chamada glúten formado por duas proteínas: a gliadina e glutenina (Fig 1 e 2). Quando misturado à água, o glúten forma uma massa viscosa e elástica capaz de aprisionar o gás carbônico produzido durante a fermentação, conferindo a textura e aparência característica do pão e bolos de trigo. Existem produtos não derivados dos cereais citados acima que possuem glúten como aditivo alimentar que lhe confere propriedade coesão-adesão (ex.: cárneos triturados e do tipo surimi para produção de kani e até em temperos).
Quando ingerido, algumas frações peptídicas da gliadina oriundas da digestão parcial do glutén são reconhecidas pelas células linfocíticas T CD4+ desencadeando resposta inflamatória autoimune, causando em médio e longo prazo dano ao tecido intestinal, achatamento da mucosa e queda na capacidade da mesma em absorver nutrientes, resultando em diarreia, dor abdominal, produção excessiva de gases, anemia, osteoporose, baixo crescimento e, ou desnutrição .
O diagnóstico da doença deve ser feito por médicos e não é simples, uma vez que os sintomas se confundem com outras doenças inflamatórias intestinais . Portanto, é preciso investigar o estado nutricional do paciente, principalmente bioquímico (ferro, vitamina B12 é ácido fólico) , sobretudo a presença de anticorpos antigliadina, antiendomísio e antitransglutaminase nas secreções intestinais .
Ainda assim, a biopsia intestinal antes e após a retirada do glúten na dieta é definitivo .
Recomenda-se aos pacientes sensíveis ou alérgicos ou glúten a isenção do mesmo da dieta, mas isto pode ser difícil, uma vez que os produtos à base de cerais estão presentes em diversos alimentos preparados. Alguns doentes em tratamento abandonam a dieta (30%) podendo não apresentar sintomas significativos, ao passo que outros são mais sensíveis e podem ter reação aguda mesmo ingerindo pequena quantidade de alimentos com glúten. Ou seja, o grau de tolerância varia entre estes doentes.
Desta forma, o ideal é a isenção de glúten dietético e promover a vigilância do que ingere, por exemplo, lendo os rótulos nutricionais na secção “ingredientes”.
Na figura 3 é apresentado um rótulo nutricional referente a um bolo. Observe que, além da informação nutricional, são apresentados os ingredientes utilizados em sua fabricação seguidos da frase “Contém glúten”. Nota-se que o produto contém farinha de trigo e, por sua vez, o glúten. Segundo a Lei Federal no 10.674, todos os fabricantes da indústria alimentícia devem escrever nas embalagens de todos os alimentos industrializados se o alimento contém ou não o glúten .
Trigo, cevada, centeio e aveia são as principais fontes de glúten , e cada glúten possui complexo de proteína peculiar. No trigo está presente a gliadina, na cevada a hordeína , e no centeio a secalina . O efeito tóxico causado por estas prolaminas está associado à gliadina e hordeína. Sobre a secalina há poucas evidências e sobre a avenina há evidências de que quantidade limitada não é prejudicial aos doentes sensíveis ao glúten. Para verificar o efeito dietético da avenina, pesquisadores finlandeses mostraram que a ingestão diária de 49 g de aveia não provocou efeito adverso na mucosa intestinal em doentes celíacos diagnosticados , e, em 2014, a Associação Celíaca Canadense se posicionou a favor do consumo diário de até 70 g de aveia como seguro aos doentes celíacos.
No Brasil, ainda não existe parecer semelhante.
Está na moda a dieta sem glúten e a recomendação para a restrição do consumo vinha sendo adotada de forma indiscriminada, o que levou o Conselho Regional de Nutricionistas (CRN-3) a promover um encontro científico para a discussão do tema no Brasil. Neste encontro ficou acordado que a eliminação do glúten da dieta só deve acontecer mediante diagnóstico clínico confirmado de doença celíaca, de dermatite herpetiforme, de alergia ao glúten, ou quando, eliminada a hipótese de doença celíaca, haja diagnóstico clínico confirmado por médicos de sensibilidade ao glúten (intolerância ao glúten–não celíaca ou NCGS).
Embora a dieta sem glúten contribua para o emagrecimento, uma vez que há menor ingestão de alimentos ricos em carboidratos tornando mais fácil o alcance do déficit energético, e, portanto, a perda de gordura corporal, a prática não é recomendada para este fim pelo risco de prejuízos à saúde, como perda de músculos e deficiência nutricional.
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